quinta-feira, 9 de abril de 2009

Primavera em Nara


A Primavera chegara finalmente e ele faltava pela segunda vez à promessa acordada entre ambos quando se conheceram: juntos celebrariam muitas estações. Não por culpa dele, pois era ela quem o privava desse quotidiano. Hoje, no seu primeiro dia de folga em 2 semanas intensas de serviço no Hospital Central, ele decidira passear-se pelas ruas de Nara. Vagueava sem destino, embalado por uma aragem madrugadoramente fresca e um sol tão tímido quanto os habitantes da cidade. Seguia envolto na paisagem rumo a Nora Park onde se cruzou com inúmeros casais que passeavam absorvidos pelas mesmas promessas frágeis de que ele padecia agora. Ao longe avistavam-se os monges em atitude verdadeiramente contemplativa. Tinham rostos diferentes, inundados de paz, como se o significado atribuído a cada elemento daquele quadro natural, sempre houvera faltado ao comum dos mortais. Isto fê-lo sentir-se mal. Esta compreensão das dádivas infindas da vida faltara-lhe nos últimos meses, ou seria mesmo nos últimos anos? Sufocado em trabalho, lamuriava a sua perda e ignorava as ofertas diárias do raiar ao pôr-do-sol. Era como se cada árvore reflectida nas margens do rio, salpicado de flores de cerejeira lhe cobrasse essa falta. A incapacidade de ser um vaso comunicante com o mundo em todo o seu potencial. Como se a natureza e essa primavera que todos os homens anseiam, mesmo sem o proferir, em cogitações próprias dos cuidados diários e dos reptos do mundo, lhe dissessem: não viste tudo durante demasiado tempo.

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